MATERIAIS COLABORATIVOS

Participe,
envie sugestões para o email:

5.1 – “Gagabirô” – com João Bosco

JOÃO BOSCO

 00:00  uma canção afro-cubana de um tempo muito distante

É aquela noção de tribo.
Eu fui tocar em Cuba em 1980
e lá ouvi uma canção afro-cubana de um tempo muito distante.[i]
Essa canção não vinha da música dançante cubana,
como a salsa e o merengue,[i]
Ela era inspirada naquilo que eles chamam de Santeria
que equivale à nossa religiosidade africana.[i]

 01:12 introdução/oração em eco

 01:58 em busca da fonte citada: “velhos cantos afro cubanos”(Egren)[i]

 02:21  Gagabirô (João Bosco)

 

Cuba e sua forte presença negra aparece espontaneamente nesse diálogo. O compositor cubano Léo Brouwer já afirmava nos anos 1970 “que todo o aparato sonoro em Cuba é uma ampliação ou transformação da percussão e do violão” (BROUWER, 1909 apud PRADA, 2008, p. 95). Ideia que remonta a práticas africanas que se aplicam perfeitamente à maneira como o toque percussivo do violão brasileiro se desenvolveu.[i]

A sofisticada digitação de mão direita estabelece a trama estrutural da canção e sua representação se vale de signos utilizados para notação em partitura de efeitos próprios à “técnica estendida” de violão.[i] Entretanto, a natureza não escrita do material reserva sua plena expressão ao “jeito pessoal” de João Bosco “tocar”,[i] resultado de uma síntese própria que reprocessa um vasto número de informações que dificilmente se sustentariam em uma “leitura” baseada nos valores cultivados pela tradição escrita. Assim, o efeito geral da execução não é efetivamente transmissível por meio de uma partitura, mas somente quando o espectador vê ou escuta a execução que, em última instância, depende dos recursos performativos do próprio autor.[i] Logo após a execução o músico salienta aspectos melódico-harmônicos por ele explorados:

 

JOÃO BOSCO

00:00  dodecafonia quase carnavalesca

Você tem uma base rítmica onde cabe inclusive a dodecafonia. Então você faz a melodia
[canta início trecho inicial]

como se fosse uma banda, quase carnavalesco,

[canta o mesmo trecho aludindo a uma seção de sopros]

aí quebra o tom com uma melodia completamente atonal, fora.

[canta frase com contorno cromático descendente]

Miles Davis já usou muito esse tipo de solução no jazz.

E a gente vai juntando uma coisa com a outra.

 01:04   show solo na Suíça em 1983

 02:05 o Sol

 02:37 o músico tem que saber que há sempre alguns vindo em socorro

 03:03 quando você não sabe o que fazer deixa que a música faça

 

Diante dos universos abordados neste trabalho, vale ressaltar que esse estado e condição de muitas vezes “não se saber direito o que fazer”, tão bem ilustrado no relato de João Bosco, é um traço mais valorizado no universo “popular” – não tão estabelecido através escrita musical – do que no “erudito”, mais determinado pelas decisões que a partitura transporta. Não sem que o próprio João Bosco complemente-se com a ideia de que o músico, justamente por não saber quando nem como o valioso do inesperado pode se apresentar, tem por dever se aperfeiçoar constantemente de modo a estar sempre “pronto” tecnicamente.[i] Nem sem que o intérprete de educação formal dentro da música “erudita” não se valha, a partir de um panorama já mais definido, de sua intuição, como no caso abaixo descrito por Sérgio Assad diante de uma composição de Radamés Gnatalli.

 

ASSAD

 00:00 tem partituras que vêm sem indicação nenhuma [i] 

 00:20 Radamés e a Brasiliana 8 [i]

 00:55 Terry Riley [i]

 01:27 indicar tudo pode congelar

 

  1. “assim uma música com feições africanas era tocada na Jamaica e, sem dúvida em outros lugares, já modificada para atender à nova demanda da comunidade de escravos multiétnica.” THORNTON, John – A África e os africanos na formação do Mundo Atlântico – 1400-1800. Rio de Janeiro. Elsevier, 2004. pág. 302.

  2. LINK com a ideia “os intérpretes eruditos em geral passam ao largo desse aspecto por não terem relação nenhuma com a música cubana. Talvez nunca tenham ouvido, apesar da propagação mundial que a salsa teve, apresentada em  – 5.2 – uma pergunta para Browuer  – no depoimento de Sérgio Assad.

  3. LINK com a ideia “é o violão, que é também um instrumento percussivo, tentando imitar um instrumento que é só percussivo” apresentada em – 5.3 – é teu? – no depoimento de Guinga.

  4. Gagabirô é citada como uma das referências para o trabalho desenvolvido pelo violonista Daniel Murray, que desembocou em sua dissertação de mestrado intitulada Técnicas estendidas para violão: Hibridização e parametrização de maneiras de tocar. UNICAMP, 2012 , p. 43.

  5. LINK com a ideia “acho que Dorival não está aí para ser decifrado, mas sim para sabermos que de fato aquele é um violão muito característico daquela voz e daquele autor” apresentada em – 1.2 – um violão que se engrena na canção – no depoimento do próprio João Bosco.

  6. LINK com a ideia “um violão como o de João Bosco tem que ver fazer. É aquela rítmica, aquela pegada” apresentada em – 6.1 – ver fazer: o “Jimbo no jazz” – no depoimento de Luiz Tatit.

  7. LINK com essa mesma ideia apresentada em – 7 alumbramento – no depoimento de João Bosco.

  8. LINK com a ideia “a maioria das partituras para violão que eu li através da vida têm pouquíssima informação. E eu achava até que o intérprete tinha que saber” apresentada em – 4.5 – tocar junto – no depoimento do próprio Sérgio Assad.

    LINK com a ideia “as partituras editadas de músicas de Guinga não apresentam um detalhamento no plano das entidades expressivas da música (fermatas, rallentandos ou acelerandos)” apresentada em – 6.5 – uma coisa poética dentro de uma música com suingue.

  9. “numa definição curta (…) as religiões afro brasileiras são basicamente religiões do transe. do sacrifício animal, e do contato direto com os deuses como meio de comungar valores e estabelecer sociabilidades em comunidades relativamente pequenas”. Ver SILVA, Vagner Gonçalves da – “Religion and black cultural identity: Roman Catholics, Afro-Brazilians and Neopentecostalism” – VIBRANT – Revista da Associação Brasileira de Antropologia – ABA, vol. 11, pp 210-246. (Versão em português: Revista Cadernos de Campo. São Paulo. Departamento de Antropologia da USP, v. 20, n. 20, jan-dez 2011) p. 295.

     

  10. Colocamos aqui o link de outro selo que registrou um canto também louvando Wemba. Nessa nota deixo expresso o desejo de ouvir o LP citado por João Bosco:  “velhos cantos afro cubanos”(Egren). Se alguém tiver esse material – e também outros relacionados à pesquisa favor entrar em contato pelo e-mail que consta na página de abertura do site.

  11. Brasiliana 8 por Duo Gnatalli.

  12. Bolanzero (Terry Riley) – The Pacific Guitar Ensemble .

FECHAR