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3.5 – parece fácil, mas é impossível

No encontro com Guinga chego, por uma outra via, ao mesmo par Cartola-Nelson Cavaquinho. Compositores referenciais para uma corrente do samba que se alimenta da elaboração melódico-harmônica oferecida pelo violão, interrogando assim, em certa medida, as “normas” habituais de composição que prescindem do instrumento no ato criativo.

 SARAIVA

E esse desejo de fazer a música sem o violão na mão
 tem um pouco a ver com essa tradição que a canção tem.
Você chegou a conviver com o Cartola, com Nelson Cavaquinho…[i]

GUINGA

 00:00 compor sem instrumento

Com vários compositores, sendo que uns faziam com instrumento e outros sem.
Mauro Duarte, que foi muito meu amigo, não tocava nenhum instrumento, fazia tudo na cabeça.[i]
João Nogueira, mal fazia dois acordes no violão, fazia tudo na cabeça,
vi isso minha vida inteira…

 00:52 se enquadrando ao “regional”

SARAIVA

Então a coisa tem que acontecer de uma forma tal
que encaixe depois quando a melodia chega para o violonista, para o cara do cavaco,
 acompanhar dentro daquele modo de ser do “regional”.
O Cartola, e o Nelson Cavaquinho, por exemplo, que tocavam violão,
chegavam a modulações e relações entre tonalidades que já eram diferentes.
Por que me parece que é diferente em alguma medida,
como é que você sente isso?

GUINGA

 01:28 Cartola e Nelson Cavaquinho

Você tá citando dois caras que, dentro do universo deles, tinham uma formação muito sólida.
Violonística e harmônica. 

 01:56 parece fácil, mas é impossível

E aí? como é que você explica um fenômeno desses?
Mas aí você cai na armadilha.
Como é que você vai explicar o Montgomery, que só tocava com o polegar? [i]
E foi o maior da guitarra jazzística.
E o Django Reinhardt?
Que tocava com o cotoco.[i]
Aí não pode mais falar de técnica, porque o cara arruma uma maneira de se expressar.
O verdadeiro artista vai arrumar sempre uma maneira de se expressar.

Eu estudei com um rapaz que escrevia com o pescoço. (não tinha os dois braços)

 

Guinga transporta a pergunta formulada a respeito de implicações harmônicas para as técnicomecânicas, deixando transparecer como, na prática, não enxerga barreiras entre o “tocar” e o “compor”. Dessa forma, o compositor valoriza a originalidadade técnico-mecânica de forma análoga à composicional.

  1. LINK com a resposta que atinge, finalmente, o aspecto melódico-harmônico em – 4.2 – o idioma do violão – no depoimento de Guinga a respeito da música Dois irmãos (Chico Buarque).

  2. LINK com a ideia que constitui a primeira categoria da esquematização apresentada no início deste capítulo.

  3. LINK com a lembrança de Wes Montgomery no capítulo – 1.1 – um violão que canta – que ocorre também a João Bosco.

  4. Isso que “parece fácil, mas é impossível” é frequente na música brasileira, tanto “urbana” quanto “rural”, como nos conta Ivan Vilela (2011, p. 49): “O som rústico, raspado, estridente, grosseiro, imperfeito – adjetivos comumente atribuídos à música caipira, nada mais são que recursos sonoros diferenciados. Trata-se de timbres e texturas que a música clássica e popular são, na maioria das vezes, incapazes de produzir.”

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